Thursday, September 30, 2004



a lebre vai passar uns dias ao Douro, para descanso e piqueniques









em dias que de dias são cenários

vi num olhar onde chovem todas as cores

palavras esquecidas no vagar da insónia



abertas a um frio que já não existe

dos olhos soltam-se como borboletas rente ao sonho



em arrepios de luz tenho as mãos

a percorrer a vertigem da cegueira

e num clarão que se abre na memória

chego a um lugar que não é meu





eue





Wednesday, September 29, 2004



mais uma tradução caseira da minha Pizarnik





explicar com palavras deste mundo

que partiu de mim um barco levando-me





Alejandra Pizarnik







Monday, September 27, 2004

Enviaram-me esta delícia por mail



Poeta



Poeta: uma criança em face do papel.

Poema: os jogos inocentes,

invenções de menino aborrecido e só.

A pena joga com palavras ocas,

atira-as ao ar a ver se ganha o jogo;

os dados caem: são o poema. Ganhou.





ADOLFO CASAIS MONTEIRO





Sunday, September 26, 2004





mecanicamente desenham-se madrugadas no interior da boca

aceleram-se sons, tiram o sentido aos lábios

são fendas a imitar a vida



por vezes dos soluços que saem do meu olhar formam-se cicatrizes

enchem-me os olhos com a humidade do sal



memorias paradas num olhar cansado



descesse o repouso ao amargo dos olhos

e num instante as estrelas afogavam-se

no interior das pálpebras





eue





Friday, September 24, 2004



a lebre a ouvir Cocorosie



Terrible angels



If every angel's terrible

Then why do you welcome them

If every angel's terrible

Then why do you welcome them

If every angel's terrible

Then why do you welcome them

You provide the birdbath

I provide the skin

And bathing in the moonlight

I'm to tremble like a kitten

If blue eyed babes

Raised as hitler's little brides and sons

They got angelic tendencies

Like some boys tend to act like queens

Oh if every angel's terrible

Then why do you watch her sleep

You love to hear her sing

And wear purple eyes like rings

Well the flowers have no scent

And the child's been miscarried

Oh every angel's terrible

Said freud and rilke all the same

Rimbaud never paid them no mind

But jimmi morrison had his elevators

His elevators

He had his elevator angels

If every angel's terrible

Why do you hide inside her

Like a child in a skirt

The supermarket's loud and bright

And boy don't she feel warm tonight

Boy don't she feel warm tonight

Boy don't she feel warm tonight

If every angel's terrible...





Cocorosie





Thursday, September 23, 2004



Algumas proposições com pássaros e árvores



QUE O POETA REMATA COM UMA REFERÊNCIA AO CORAÇÃO



Os pássaros nascem na ponta das árvores



As árvores que eu vejo em vez de fruto dão pássaros

Os pássaros são o fruto mais vivo das árvores

Os pássaros começam onde as árvores acabam

Os pássaros fazem cantar as árvores

Ao chegar aos pássaros as árvores engrossam movimentam-se

deixam o reino vegetal para passar a pertencer ao reino animal

Como pássaros poisam as folhas na terra

quando o outono desce veladamente sobre os campos

Gostaria de dizer que os pássaros emanam das árvores

mas deixo essa forma de dizer ao romancista

é complicada e não se dá bem na poesia

não foi ainda isolada da filosofia

Eu amo as árvores principalmente as que dão pássaros

Quem é que lá os pendura nos ramos?

De quem é a mão a inúmera mão?

Eu passo e muda-se-me o coração



Ruy Belo















Wednesday, September 22, 2004





Desfolhar uma rosa

é poesia

ou prosa?



Cruzeiro Seixas







Thursday, September 16, 2004



os olhos ganham a intensidade das rugas

todas a sombras se juntam como

linhas de uma folha



é neste tempo de sílabas murchas

que nos olhos param imagens



o outro lado dos olhos são pedacinhos

de papel que rasguei num domingo





eue





A lebre hoje lembrou-se deste poema lindo.

Nunca se sentiram assim?



I'd give all the wealth that years have piled

The slow result of Life's decay

To be once more a little child

For one bright, summer-day



Lewis Carroll





Wednesday, September 15, 2004

Hoje a lebre andou em arrumações e arejamento de tralhas e ideias. Amanhã volta devidamente artilhada com novas coisas para mostrar.





Tuesday, September 14, 2004

Lebre em modo suspiro.

Hoje não consigo parar de ouvir esta canção (como eu gostava quando a passava no programa de rádio)

O Ed Harcourt é fabuloso.





God Protect Your Soul



Well I hope God protects your soul

I don't know if you should leave home alone

Maybe you've been drinking from the Devil's bowl

I can't express myself 'cause I'm not fully grown



My heartache, is my mistake you see

My heartache, is my mistake you see



Well I am conscious of the way that I act

But I won't betray you, you can be sure of that

I'm not a pet who does tricks at the drop of a hat

I wish I was fiction, I wish I was fact



My heartache, is my mistake you see

My heartache, is my mistake you see



I need to build a wall around me

I need to build a wall around me

But I want to smile with everybody

Would you say that is possessive of me?

Would you say that is possessive of me?



Yes we feel bad in winter

We act a little bit strange

The dark sky threatens me daily

Makes me alter and change, change, change, change



I need to build a wall around me

I need to build a wall around me

But I want to smile with everybody

Would you say that is possessive of me?

Would you say that is possessive of me?



I need to build a wall around me

I need to build a wall around me

But I want to smile with everybody

Would you say that is possessive of me?

Would you say that is possessive of me?.



Ed Harcourt







Monday, September 13, 2004



quando leio, faço inventários de tudo o que não pertence à insónia

um dia escrever-te-ei no ar onde as papoilas se afogam

explicar-te-ei como te tenho no colo de todas as palavras impossíveis

e com a lentidão dos passos afastar-te-ás do dia em que os gestos são papoilas

é tão impossível pensar que a tua voz se tornou inaudível

e é por esse silêncio que as vozes coagulam

e se dentro das palavras talvez haja paisagens

da tua boca só sai o frio acumulado por meses de Inverno







eue





Saturday, September 11, 2004

Apetece-me partilhar



Friday, September 10, 2004

Canção



No mistério do Sem-Fim,

equilibra-se um planeta.



E, no planeta, um jardim,

e, no jardim, um canteiro;

no canteiro, uma violeta,

e, sobre ela, o dia inteiro,



entre o planeta e o Sem-Fim,

a asa de uma borboleta.





Cecília Meirelles







Thursday, September 9, 2004



todas as cores de um sonho para a minha mana linda



SONHO







Foi um sonho que eu tive:

Era uma grande estrela de papel,

Um cordel

E um menino de bibe.

O menino tinha lançado a estrela

Com ar de quem semeia uma ilusão;

E a estrela ia subindo, azul e amarela,

Presa pelo cordel à sua mão.

Mas tão alto subiu

Que deixou de ser estrela de papel.

E o menino, ao vê-la assim, sorriu

E cortou-lhe o cordel.







Miguel Torga





Wednesday, September 8, 2004



EL BURRO Y LA FLAUTA



Tirada en el campo estaba desde hacía tiempo una Flauta que ya nadie tocaba, hasta que un día un Burro que paseaba por ahí resopló fuerte sobre ella haciéndola producir el sonido más dulce de su vida, es decir, de la vida del Burro y de la Flauta.



Incapaces de comprender lo que había pasado, pues la racionalidad no era su fuerte y ambos creían en la racionalidad, se separaron presurosos, avergonzados de lo mejor que el uno y el otro habían hecho durante su triste existencia.



Augusto Monterroso









Tuesday, September 7, 2004





Vieste como um barco carregado de vento, abrindo

feridas de espuma pelas ondas. Chegaste tão depressa

que nem pude aguardar-te ou prevenir-me; e só ficaste

o tempo de iludires a arquitectura fria do estaleiro



onde hoje me sentei a perguntar como foi que partiste,

se partiste,

que dentro de mim se acanham as certezas e

tu vais sempre ardendo, embora como um lume

de cera, lento e brando, que já não derrama calor.



Tenho os olhos azuis de tanto os ter lançado ao mar

o dia inteiro, como os pescadores fazem com as redes;

e não existe no mundo cegueira pior do que a minha:

o fio do horizonte começou ainda agora a oscilar,

exausto de me ver entre as mulheres que se passeiam

no cais como se transportassem no corpo o vaivém

dos barcos. Dizem-me os seus passos



que vale a pena esperar, porque as ondas acabam

sempre por quebrar-se junto das margens. Mas eu sei

que o meu mar está cercado de litorais, que é tarde

para quase tudo Por isso, vou para casa



e aguardo os sonhos, pontuais como a noite.







Maria do Rosário Pedreira









Monday, September 6, 2004



O triunfo do dia



O sol entra na casa o que

perdemos é já demasiado

para podermos distinguir da parede

o retrato Houve um futuro

no fumo que sangrava

É a forma invisível que uma onda

de luz irá salvar? Esse encontro

da casa com o dia criará uma névoa

que nega a própria luz e vai como

uma nuvem guardar todo o poder

até se transformar num relâmpago

que não pertence ao dia

porque é o que ficou do que perdeu a

existência e de novo se perde

quando a onda regressa

ao dia de onde veio

enrolada levando na sua luz o rosto



GASTÃO CRUZ







Friday, September 3, 2004

Hoje ao ler um poema do João do Nascimento, fiquei com esta frase a martelar-me a cabeça



(…) e é naquele café onde paro todos os dias, e de onde me conhecem, onde se ao acordar não souber de mim me encontro.(…)